Os Cidadãos de Boa Vontade
Têm Um Dever Diante de Si
Carlos Cardoso Aveline
O planeta Terra pode funcionar como um jardim comunitário
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Uma versão inicial do texto a seguir foi
publicada de modo anônimo no boletim
mensal “O Teosofista”, em Agosto de 2010.
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É notável a dificuldade da civilização atual de pensar o conjunto da questão planetária. Estamos vendo em primeira mão o que ocorre quando o carma coletivo amadurece e o prazo de validade de uma forma de organização está vencido.
Há bem mais que uma limitação cultural. Há uma cegueira organizada, e ela boicota toda capacidade de enxergar. De fato, o pior cego é aquele que não quer ver. Mas isso vai mudar. Já aumentam os sinais de um despertar da consciência planetária.
A civilização de hoje, como grande parte das civilizações anteriores, é baseada na premissa de que a natureza é inimiga do homem.
A ideia primordial, ainda que implícita, é de que a natureza deve ser substituída pelo asfalto, pela energia atômica, pelo desmatamento, pela desertificação, pelas guerras, pela especulação imobiliária, pelo massacre dos animais, e - claro - por uma filosofia social darwinista, segundo a qual devem dominar “os mais aptos”. Os mais “aptos” são, deste ponto de vista, os mais egoístas, os mais gananciosos, os mais astutos, aqueles que são espiritualmente destituídos de alma e de consciência ética. E, no contexto atual, pode-se mesmo constatar que alguns dos indivíduos “poderosos” cuja fé está colocada na premissa darwinista têm, literalmente, a consciência ética e filosófica de um gorila das selvas. Só lhes falta o respeito instintivo pela vida natural e pela lei do carma que os gorilas autênticos possuem. Os macacos tecnológicos não sabem o que é equilíbrio.
Seria agradável se a ignorância espiritual socialmente organizada pudesse ser eliminada com um custo histórico baixo. Não é isso que estamos vendo, no entanto. As notícias sobre exemplos de desorganização climática se espalham e se tornam coisas cada dia mais corriqueiras. Sua importância é ignorada. Grandes catástrofes são tratadas como fato banal, enquanto a novela de televisão, as entrevistas dos “famosos” e as últimas falsas novidades sobre qualquer assunto fútil estão no centro das atenções da mídia dominante.
A cultura civilizatória atual ainda não adotou de modo amplo os parâmetros filosóficos que a permitirão compreender e processar inteligentemente o processo planetário. Há na psicologia coletiva de hoje um medo profundo de alterações climáticas, associadas subconscientemente a velhas imagens de “fim de mundo” fabricadas pela teologia da idade média. O terror supersticioso paralisa a capacidade de preparar-se com ética e com bom senso para uma mudança climática.
Por outro lado, a teosofia ensina que a decadência da base geológica da atual civilização está diretamente ligada à decadência das bases mentais, intelectuais, morais e emocionais da etapa humana que está terminando. A decadência precede, e prepara, a regeneração.
O planeta é um único processo multidimensional. Ele tem sete níveis de consciência operando simultaneamente, e todos esses níveis estão vivendo - entre o século 19 e o século 22 - o final de um ciclo e o começo de outro.
O receio subconsciente de enfrentar os fatos é, pois, um fator que não pode ser subestimado. Grandes mudanças provocam medo, inclusive quando são geológicas, e o filósofo espanhol Emilio Mira y López escreveu:
“Terremotos, incêndios, inundações, raios, avalanchas, são (...) eventos não só capazes de assustar-nos com sua presença, mas também de fazer-nos estremecer ante sua real ou suposta iminência. Não é apenas por pressentir a probabilidade de um dano físico mais ou menos grave que tais cataclismos nos aterrorizam, mas por outros motivos, entre os quais se destacam os de sua ancestralidade, seu imenso poder e sua inevitabilidade. Realmente, desde os tempos mais remotos, esses fenômenos têm causado a morte das mais variadas espécies animais. Por isso, em nosso genoplasma, estão latentes os dispositivos de alarme e fuga ante a simples evocação de sua imagem ou lembrança.”[1]
Isso explica grande parte da dificuldade de uma mudança de atitude diante da questão ambiental.
No entanto, é cada dia mais fácil acelerar a ampliação do caminho do meio entre dois extremos igualmente paralisantes.
De um lado, temos o apego à rotina consumista, que nega a necessidade de uma mudança na relação da humanidade com o ambiente natural. De outro lado, há o conhecido fatalismo que considera o “fim do mundo” inevitável, e pensa que só o deus imaginário criado pelos sacerdotes profissionais é capaz de enfrentar o assunto.
O caminho do meio, que é o caminho do bom senso, ainda parece estreito e difícil. Mas ele já existe e é claramente indicado pela filosofia e pela teosofia.
Ao longo dos milênios, inúmeras civilizações cumpriram suas missões e foram substituídas, frequentemente através de crises ambientais. A civilização atual não é eterna e está em crise. Mas o final de uma civilização e o começo de outra não são algo súbito. Eles devem ser encaminhados passo a passo e gradativamente.
Nem a preguiça nem o pânico são bons conselheiros. O momento atual é de preparação para um despertar. O planeta Terra pode funcionar como um jardim comunitário, e já são grandes as oportunidades para que os cidadãos ajam criativamente. Começa a surgir uma nova consciência ética universal. O renascer não pode ser acelerado pela propaganda, mas sim pela vivência interna da sabedoria universal, pela prática da ajuda mútua, e pelo plantio de bom carma no plano da alma.
NOTA:
[1] “Os Quatro Gigantes da Alma”, Emilio Mira y López, Livraria José Olympio Editora, RJ, 1980, 224 pp., ver p. 33.
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