quarta-feira, 7 de novembro de 2012

A Visão Planetária de Barack Obama




Presidente dos Estados Unidos

Aplica Princípios da Teosofia Clássica    



Carlos Cardoso Aveline
                                                                     

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Barack  Obama


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Nota Editorial de 2012:

Atuando com bom senso e pragmatismo,
o pensador humanista que preside o país mais
poderoso do mundo fez com que o militarismo
convencional deixasse de ser prioridade. Atuando
de modo que nem todos percebem, Barack Obama
ajuda a preparar as bases éticas da civilização do futuro.
O texto a seguir mostra as linhas filosóficas da sua
trajetória até ser eleito pela primeira vez, no final de 2008.

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“O verdadeiro teosofista não pertence a nenhum
culto ou seita, e no entanto pertence a todos eles”.

Robert Crosbie


“Em nossa casa, a Bíblia, o Alcorão e o Bhagavad
Gita ficavam na prateleira juntamente com os livros
da mitologia grega,  norueguesa e africana. Na
Páscoa ou no Natal [minha mãe] me arrastava para
a igreja, assim como para templos budistas, para a
celebração do Ano Novo chinês, para santuários
xintoístas ou para antigos locais de rituais havaianos.”

Barack Obama


“Formar o núcleo de uma Fraternidade Universal da
Humanidade, sem distinção de raça, credo, sexo, casta ou cor....”

(Primeiro objetivo do movimento teosófico moderno)


“Os muros entre os velhos aliados dos dois lados
do Atlântico não podem ficar de pé. Os muros entre os
países que têm muito e os países que têm muito pouco não
podem ficar de pé.  Os muros entre raças e tribos; nativos e
imigrantes; cristãos e muçulmanos e judeus, não podem ficar
em pé.  Estes são, agora, os muros que nós devemos derrubar.”

Barack Obama



A  teosofia  é uma filosofia planetária e a sua meta primeira é despertar a compreensão e a vivência da fraternidade universal.  Assim como o  movimento teosófico, ela é independente de rótulos, nomes pessoais, ideologias ou organizações. O que define o verdadeiro campo de ação da teosofia clássica e do seu estudante são fatores muito reais mas  intangíveis como a compreensão das leis da natureza, a consciência ética e uma solidariedade para com todos os seres.   


Ter acesso à sabedoria divina é um assunto de almas e não de corporações ou instituições.  William Judge, um dos principais fundadores do movimento esotérico moderno, escreveu:

“Como o Movimento Teosófico é contínuo, ele pode ser encontrado em  todos os tempos e todas as nações. Onde  quer que o pensamento venha lutando para ser livre, onde  quer que as idéias espirituais tenham sido promulgadas em oposição às formas e ao dogmatismo, lá o grande movimento pode ser percebido.” [1]  

Deste ponto de vista, um cidadão de boa vontade e visão ampla pode ser considerado um verdadeiro teosofista, ainda que não seja membro de qualquer agrupação teosófica. Não importa se ele é cristão, judeu, budista, muçulmano  ou  seguidor de outra filosofia.  Na medida em que ele compreende a universalidade da ética planetária,  sua vida ajuda a abrir espaço para a percepção da fraternidade universal, e ele é um verdadeiro teosofista, no plano da alma.  

Este parece ser o caso de Barack Obama, eleito presidente dos Estados Unidos  em  novembro de 2008, e reeleito em 2012 para liderar o país mais influente do nosso processo civilizatório. Ao examinar fatos da vida de Obama e fragmentos dos livros que escreveu,  podemos avaliar o grau de afinidade que há entre ele e a sabedoria universal.  

Derrubando os Muros Entre Povos, Raças e Religiões

Em julho de 2008,  Barack Obama falou em Berlim, Alemanha, para uma multidão calculada pelas autoridades policiais em duzentas mil pessoas. Ele abriu o evento sem precedentes esclarecendo que estava ali na condição de “cidadão do mundo”  - uma expressão que contém em si mesma a idéia da cidadania planetária e de um mundo sem fronteiras.  Ali estava um cidadão em campanha eleitoral nos Estados Unidos, falando em manifestação de rua em país europeu. No discurso, Obama formulou a sua proposta de cooperação entre todos os povos. Referindo-se indiretamente à derrubada democrática do Muro de Berlim, em 1989,  ele disse:       

“A solidariedade e a cooperação entre as nações não é uma escolha. É o único caminho, o único caminho,  para proteger a nossa segurança comum e  fazer avançar a nossa humanidade comum.  É por isso que o maior de todos os perigos seria permitir que novos muros nos dividam uns dos outros. Os muros entre os velhos aliados dos dois lados do Atlântico não podem ficar de pé. Os muros entre os países que têm muito e os países que têm muito pouco não podem ficar de pé.  Os muros entre raças e tribos; nativos e imigrantes; cristãos e muçulmanos e judeus, não podem ficar em pé.  Estes são, agora, os muros que nós devemos derrubar.  Nós sabemos que eles caíram antes. Depois de séculos de conflito,  os povos da Europa formaram uma união promissora e próspera.”

E prosseguiu:

“Aqui, na base de uma coluna construída para marcar a vitória na guerra, nós nos encontramos no centro de uma Europa em paz. Muros caíram não só em Berlim, mas eles vieram abaixo em Belfast, onde os protestantes e os católicos descobriram uma maneira de viver lado a lado; nos Balcãs, onde a nossa aliança Atlântica terminou as guerras e apresentou criminosos de guerra à justiça; e na África do Sul, onde a luta de um povo corajoso derrotou o apartheid. Assim, a história nos faz lembrar do fato de que os muros podem ser derrubados. Mas a tarefa nunca é fácil. A verdadeira cooperação e o verdadeiro progresso requerem um trabalho constante e um sacrifício contínuo. Eles exigem que se compartilhe as responsabilidades do desenvolvimento e da diplomacia; do progresso e da paz. Eles requerem aliados que escutam uns aos outros, que aprendem uns dos outros,  e, sobretudo, que confiam uns nos outros.” [2]

Libertar o Mundo Das Armas Nucleares

Barack Obama acrescentou:

“Este é o momento em que devemos renovar a meta de um mundo sem armas nucleares. As duas superpotências  que olhavam uma para a outra através do muro desta cidade estiveram demasiado perto, por um tempo demasiado longo, de destruir tudo o que nós construímos e tudo o que amamos. Com o final daquele muro, nós não necessitamos ficar parados sem fazer nada, olhando para a proliferação da energia atômica mortal. (...) Este é o momento de começar a trabalhar em busca da paz de um mundo livre de armas nucleares.”

Depois Obama falou da necessidade de  paz no Oriente Médio, e abordou a questão da ecologia planetária.  Ele disse:

“Este é o momento em que devemos unir-nos para salvar este planeta. Devemos tomar a decisão de que não deixaremos para nossos filhos um mundo em que os oceanos se  elevam, e a fome se espalha, e  tempestades terríveis devastam as nossas terras. Devemos decidir que todas as nações - inclusive a minha própria - agirão com a mesma seriedade de propósito que a sua nação [a Alemanha], e reduzirão o carbono que colocam na atmosfera.[3]  Este é o momento em que devemos devolver às nossas crianças o futuro que pertence a elas. Este é o momento para agirmos em unidade.” [4]  

A Intenção de Refazer o Mundo

Obama parece saber o que deve  fazer. E não pode ser acusado de possuir metas demasiado pequenas.  Filho de um queniano, e nascido Havaí, ele concluiu o seu primeiro discurso fora  dos Estados Unidos com estas palavras:

“Povo de Berlim - povo do mundo - este é o nosso momento.  Esta é a nossa vez. Eu sei que meu país não tem se aperfeiçoado. (...) Nós temos a nossa quota de erros. (...)  Mas também sei que (...)  durante mais de duzentos anos, nós temos nos esforçado (...) com outras nações, [por] um mundo com mais esperança.  Nosso compromisso nunca foi com qualquer tribo ou reino especificamente – na verdade, todas as línguas são faladas em nosso país; todas as culturas deixaram sua marca na nossa cultura; e cada ponto de vista é expressado em nossas praças públicas. O que sempre nos uniu - o que sempre mobilizou o meu povo -  o que atraiu o meu pai para o território norte-americano, é um conjunto de ideais que correspondem a aspirações compartilhadas por todos os povos: a crença de que podemos viver livres de medo e de necessidades materiais graves; de que podemos dizer o que pensamos, e reunir-nos com quem quisermos, e seguir a religião que acharmos melhor. (...)  Povo de Berlim - e povo do mundo - a escala do nosso desafio é grande. O caminho à frente será longo.  Mas venho dizer a vocês que somos herdeiros de uma luta por liberdade. Que somos um povo de esperanças improváveis. Com o olhar voltado para o futuro, com decisão em nossos corações, que possamos lembrar desta história,  fazer frente ao nosso destino e refazer o mundo mais uma vez.”

Pouco mais de um ano antes do discurso de Berlim, Obama já tinha uma clareza de metas. 

Em fevereiro de 2007, ao fazer o discurso de lançamento da sua candidatura, ele assumiu um compromisso com a mudança ética e ecológica em escala  planetária:

“Sejamos a geração que finalmente liberta a América do Norte da tirania do petróleo. Podemos usar combustíveis alternativos, produzidos localmente, como o etanol, e aumentar a produção de carros com mais eficiência energética. Podemos estabelecer um sistema de fixação de gases que produzem o efeito estufa. Podemos transformar esta crise de aquecimento global em uma oportunidade para inovar, e para criar empregos, e para incentivar empreendimentos que servirão de modelo para o mundo. Sejamos a geração que faz com que as futuras gerações tenham orgulho do que nós fizemos aqui.” [5]

Sem receio de assumir metas visionárias - e olhando muito além das eleições norte-americanas -, ele disse naquela ocasião inaugural:

“E se vocês se somam a mim nesta luta improvável, se vocês sentem o chamado do destino, e vêem, como eu vejo, que o momento de acordar e de abandonar o medo é agora, assim como o momento de pagar a dívida que temos diante das gerações passadas e futuras, então estou pronto a assumir esta causa e marchar com vocês, e trabalhar com vocês.  Juntos, a partir de hoje, que completemos o trabalho que necessita ser feito, de trazer para esta Terra um novo nascimento da liberdade.” [6]


A Regra de Ouro

A proposta de Obama para os Estados Unidos e o  mundo é acusada por seus adversários de ser vaga e ambígua. Ele chegou a ser qualificado como “pouco norte-americano”.   A verdade é que Obama tem uma visão mais complexa e mais profunda do que meras bandeiras eleitorais ou nacionalistas.  A base do seu discurso é simultaneamente inter-religiosa, ética e filosófica. Está na famosa Regra de Ouro, um velho princípio da filosofia clássica grega e da antiga sabedoria oriental, que foi ensinado por Confúcio nos “Analectos” (Livro V, capítulo XI) e adotado mais tarde pelo cristianismo. Este princípio ético milenar poderia ser chamado, corretamente,  de “lei do bom carma”. 

Obama esclarece:

“No final das contas, o que se necessita é nada mais, nada menos, que aquilo que todas as grandes religiões do mundo exigem – que façamos aos outros aquilo que queremos que eles façam a nós. Devemos proteger o nosso irmão, como a escritura diz. Devemos proteger a nossa irmã. Devemos encontrar aquele interesse comum que todos temos uns nos outros, e fazer com que a nossa política reflita este espírito.” [7]

O Espírito de Aloha

Parece haver algo de autenticamente teosófico na vida real de Barack Obama, que pode explicar por que ele faz repetidamente uma “valente declaração de princípios”, para usar as palavras da Escada de Ouro da teosofia de H. P. Blavatsky.  Ele ensina como um mantra alguns dos principais princípios teosóficos, especialmente o do compromisso com a  Ética Universal presente em todas as religiões.  

Mas qual é exatamente a sua formação, do ponto de vista da sabedoria universal?

Em que atmosfera Obama foi criado?

Ele nasceu em agosto de 1961 no Havaí. Não por casualidade a sua vida e suas idéias parecem expressar, até certo ponto, o espírito de “Aloha”. 

A  palavra  “Aloha” é um verdadeiro mantra sagrado na cultura havaiana,  famosa mundialmente por sua abertura mental e fraternidade em relação a todos os povos.  É  uma saudação e um conceito universalista. O termo é considerado equivalente à palavra sânscrita “Namastê” (“a divindade em mim saúda a divindade em você”). Mas também significa “Shalom”, “Paz”, assim como “Compaixão” e “Amizade”. 

O chamado “espírito de Aloha” implica um estado mental de paz consigo mesmo e com todos os seres. A filosofia, o  discurso  e a prática de Barack Obama parecem expressar alguma coisa deste mantra e desta cultura presentes em sua juventude.

Os avós maternos de Barack, que  tiveram um papel central na educação do garoto,  não só viviam no Havaí  com o neto mas foram influenciados em determinado momento pela Igreja Unitária Universalista.  Esta era uma igreja  que buscava a confraternização das religiões e que mantinha laços estreitos com a Sociedade hinduísta Brahmo Samaj.  A pensadora russa Helena Blavatsky escreveu extensamente sobre o movimento Brahmo Samaj, elogiando seu fundador e criticando os erros cometidos por seus líderes posteriores. [8]   Barack Obama escreveu, sobre seu avô materno:

“Ele gostava da idéia de que os Unitários estudavam as escrituras de todas as grandes religiões”.

Segundo Barack, o avô materno considerava que isso era “como ter cinco religiões em uma”. [9]

Avô  Paterno Era Curandeiro Africano  

Hussein Onyango Obama, avô paterno de Barack Obama, foi um curandeiro africano do Quênia. Ele era muçulmano, tinha poderes de cura e viveu imerso nas tradições da cultura local. [10]  

O pai de Barack Obama, africano e negro, também se chamava Barack. Este foi seu mestre e seu herói.  Barack, o pai, deixou  na vida de Barack, o  filho,  uma presença transcendente  e uma influência mítica. No universo infantil de Barack,  o mundo intangível em que seu pai existia se misturava de algum modo com as origens do cosmo. E este era mais do que um fato psicológico.

A origem e o destino do  universo é um tema central em teosofia. Na sabedoria esotérica oriental, o assunto se relaciona com o caminho das grandes iniciações.

Ao longo da sua obra “A Doutrina Secreta”, H. P. Blavatsky faz um estudo comparado das principais narrativas da origem do universo e do homem,  mostrando os pontos em comum que há entre os relatos dos caldeus, da Bíblia judaica e cristã, da Cabala judaica,  do Popol Vuh centro-americano, dos Puranas hindus, e de escrituras muitos outros povos.  Barack Obama enfrentou este tema cósmico em sua infância, junto ao tema do pai-mito, o pai interior.  

Em um  dos seus livros ele confessa, não sem humor:

“... O caminho  da vida do meu pai ocupava o mesmo terreno que um livro que minha mãe comprou uma vez para mim, um livro chamado “Origens”, uma coleção de histórias da Criação de todas as partes do mundo, histórias de Gênese e da árvore na qual havia nascido o homem, Prometeu e o presente do fogo, a tartaruga da lenda hindu que flutuava no espaço, sustentando o peso do mundo sobre as suas costas. Mais tarde, quando fiquei mais acostumado ao caminho estreito para a felicidade a ser encontrado na televisão e nos filmes, eu  ficava perplexo com várias questões. Em que se apoiava a tartaruga? Por que motivo um Deus onipotente permitiu que uma serpente causasse tamanho sofrimento?   Por que meu pai não voltava? Mas com cinco ou seis anos de idade eu estava satisfeito com deixar estes mistérios distantes intactos...”. [11]

A Mãe Universalista

Foi a mãe de Obama,  branca e  norte-americana,  que lhe transmitiu na vida cotidiana a visão inter-religiosa e universalista, assim como o  hábito diário do auto-treinamento e da auto-disciplina.  Ela mantinha uma distância crítica das religiões dogmáticas. Ela tinha isso em comum com a teosofia clássica e original, enquanto  a  pseudo-teosofia criada por Annie Besant preferiu criar versões próprias da religiosidade exotérica, com  seus sacerdotes e seus rituais.  

Barack escreve que seus avós passaram à sua mãe uma combinação de racionalismo com jovialidade, e acrescenta:

“As próprias experiências de minha mãe como criança sensível e amiga dos livros, que crescia nas pequenas cidades do Kansas, Oklahoma e Texas,  apenas reforçaram o ceticismo que herdara. As lembranças dos cristãos que povoavam sua juventude não eram das mais agradáveis. Ela ocasionalmentese recordava dos pregadores que baniam três quartos  da população mundial por considerá-los pagãos ignorantes condenados a passar a vida eterna em maldição – e que insistiam que a terra e o céu foram criados em sete dias , com todas as provas geológicas e astrofísicas dizendo o contrário. Lembrava-se das mulheres respeitáveis da igreja, sempre tão rápidas em evitar as pessoas que não correspondessem aos seus padrões de decência, apesar de elas próprias ocultarem segredinhos sujos; dos pastores que proferiam epítetos raciais e ludibriavam os trabalhadores para tirar deles todo o dinheiro que conseguissem.”

Tal mediocridade “religiosa”  não ocorria por acaso. 

Há um contexto maior em torno deste tipo de estreiteza de horizontes, que não é um fenômeno local, mas  constitui na verdade um problema de escala global, combatido de frente por Helena Blavatsky e alguns outros teosofistas desde 1875. 

A verdadeira religiosidade não pode ser transformada em prisioneira de uma instituição ou ritual, nem pode  distanciar-se por um momento da filosofia ou da ciência. Ela deve, isto sim, avançar interdisciplinarmente, unida ao livre-pensamento.

Na famosa Carta 88 de “Cartas dos Mahatmas” (Editora Teosófica,  Brasília, dois volumes) , um mestre dos Himalaias -  um raja-iogue  -  afirma que dois terços do sofrimento humano são causados pela  falsidade e pelas ilusões provocadas pelas religiões dogmáticas e sacerdotais.

A narrativa de Barack Obama prossegue:

“Para minha mãe, a religião organizada muito frequentemente esconde sua mentalidade limitada sob o manto da piedade; e a crueldade e a opressão, sob o da honestidade.  Mas isso não quer dizer que ela não me transmitiu valores religiosos. Para minha mãe, o conhecimento de pontos importantes das grandes religiões do mundo era uma parte necessária de uma educação impecável. Em nossa casa, a Bíblia, o Alcorão e o Bhagavad Gita ficavam na prateleira juntamente com os livros da mitologia grega,  norueguesa e africana. Na Páscoa ou no Natal [minha mãe] me arrastava para a igreja, assim como para templos budistas, para a celebração do Ano Novo chinês, para santuários xintoístas ou para antigos locais de rituais hawaianos. Mas fui educado para entender que isso não exigia nenhum compromisso de longo prazo da minha parte, nenhum esforço introspectivo maior ou autoflagelação. Para minha mãe, a religião era uma expressão da cultura humana; ela não explicava a origem da humanidade, era apenas uma das muitas formas – e não necessariamente a melhor maneira – de o homem tentar controlar o desconhecido e entender as mais profundas verdades sobre nossa vida.  Em suma, minha mãe via a religião pelos olhos da antropóloga que ela viria a ser; era um fenômeno a ser tratado com respeito, mas também com desapego.” [12]

Obama afirma ainda, a respeito de sua mãe e instrutora:
“E, apesar do seu secularismo, minha mãe era de muitas formas a pessoa mais espiritualizada que conheci.  Tinha um instinto inabalável para a bondade, a caridade e o amor, e passou grande parte da sua vida agindo de acordo com estes instintos, às vezes em detrimento de si mesma. Sem a ajuda de textos religiosos ou autoridades externas, trabalhou muito para transmitir a mim os valores que muitos norte-americanos aprendem na escola dominical: honestidade, empatia, disciplina, capacidade de postergar a gratificação pessoal e trabalho duro.  Enfurecia-se com a pobreza e a injustiça, e desprezava aqueles que eram indiferentes a ambas.” [13]

Uma Visão Racional

Barack construiu sua vida sobre este alicerce filosófico e emocional, intelectualmente profundo  mas também inseparável de atitudes práticas e concretas.    

Em suas obras, o leitor encontra passagens em que ele faz, de várias formas, uma declaração de princípios.  Não é difícil perceber que o raciocínio de Barack está baseado em uma visão  ampla e universal que pode ser considerada claramente  teosófica no sentido clássico da palavra. Ele afirma: 

“... Dada a diversidade crescente da população norte-americana, os perigos do sectarismo nunca foram maiores.  O que quer que já tenhamos sido, não somos mais apenas uma nação cristã; somos também uma nação judaica, muçulmana, budista, e uma nação de descrentes.”

E prossegue:

“Mas presumamos que só tivéssemos cristãos dentro dos limites das nossas fronteiras. Que cristianismo ensinaríamos  nas escolas? (....) Que passagens do  Evangelho deveriam  guiar nossa política pública? Deveríamos seguir o Levítico, que sugere que não há nada de errado com a escravidão e que comer moluscos é uma abominação? E quanto ao Deuteronômio, que sugere apedrejar seu filho caso ele se desvie da fé?   Ou deveríamos nos limitar apenas ao Sermão da Montanha – uma passagem tão radical que é duvidoso que nosso Departamento de Defesa sobrevivesse à sua aplicação?”

Para Obama, a crença cega na letra morta deve ser abandonada. Os princípios essenciais devem ser percebidos, e eles estão além das formas visíveis. Barack conclui propondo a opção pelo bom senso:

“O que nossa democracia deliberativa e pluralista exige é que pessoas motivadas religiosamente traduzam suas preocupações para valores universais, não determinados pela religião. Isto exige que suas propostas estejam sujeitas a discussões e abertas à razão.” [14]

O Presidente Não Faz Milagres

Como presidente dos Estados Unidos, Obama não fez muitos milagres visíveis.

Atuando sob o carma -  isto é, dentro das limitações históricas do seu momento -  ele produziu um clima internacional que leva a um respeito crescente pela paz e pelos modos não-violentos de resolução de conflitos.  

A euforia militarista de tempos anteriores foi abandonada. Ele ajudou a construir uma atmosfera em que o diálogo é possível. Além das suas palavras, que são claras, Obama realiza com eficácia silenciosa outras tarefas intangíveis e “invisíveis”.  

É verdade que os  seus críticos mais míopes -  capazes de enxergar apenas o que é pequeno e que está imediatamente diante dos seus narizes -  se comprazem em exagerar as limitações do  trabalho de Obama no curto prazo do plano material e econômico. Enquanto isso, atuando como estadista e líder mundial,  ele ajuda a construir as premissas éticas e as bases humanísticas da civilização do futuro.

O próximo passo evolucionário da comunidade internacional é o respeito comum pela paz, pela ética e pela justiça, e esta meta deve ser mantida viva ao longo da vida diária. Em setembro de 2011, Obama disse em um discurso na Assembléia Geral das Nações Unidas:

“É da natureza do nosso mundo imperfeito que nós sejamos forçados a aprender estas lições uma e outra vez. Os conflitos e a repressão irão ocorrer enquanto algumas pessoas se recusarem a agir em relação aos outros como elas gostariam que os outros agissem em relação a elas. No entanto é exatamente para isso que nós construímos instituições como esta - para unificar os nossos destinos, para tornar mais fácil que reconheçamos a nós próprios uns nos outros - porque aqueles que vieram antes de nós acreditavam que a paz é melhor que a guerra, a liberdade é melhor que a opressão, e a prosperidade é melhor que a pobreza. Esta é a mensagem que vem, não das capitais, mas dos cidadãos, do nosso povo. E quando a pedra fundamental deste mesmo edifício [das Nações Unidas] foi colocada, o presidente [Harry] Truman veio aqui a Nova Iorque e disse: “As Nações Unidas são essencialmente uma expressão da natureza moral das aspirações humanas.” A natureza moral das aspirações humanas. Vivendo hoje num mundo que muda a um ritmo de tirar o fôlego, esta é uma lição que não devemos jamais esquecer. A paz é difícil, mas sabemos que é possível. Então, tomemos juntos a decisão de fazer com que nossa atitude diante da paz seja definida pelas nossas esperanças e não pelos nossos medos.  Juntos, façamos a paz, mas uma paz, e isso é o mais importante, que irá durar.” [15]


NOTAS:

[1] “Theosophical Articles”, William Q. Judge, The Theosophy Co., Los Angeles, 1980, edição em dois volumes, ver vol.  II,  p. 124.

[2] “Change We Can Believe In - Barack Obama’s Plan to Renew America’s Promise”, livro com o programa de governo e sete discursos de Obama, publicado por  Three Rivers Press, New York, 2008,  274 pp., ver pp. 265-266.

[3] A Alemanha é um dos países do mundo em que há mais consciência ambiental. A própria Chanceler Angela Merkel  tem uma longa trajetória pessoal de compromisso com a preservação do meio ambiente.

[4]  “Change We Can Believe In”, obra citada, p. 267 a 269.

[5]  “Change We Can Believe In”, obra citada, pp. 198-199.

[6]  “Change We Can Believe In”, obra citada, pp. 201-202.

[7] “Change We Can Believe In”, obra citada, p.  228.

[8]  Veja, por exemplo,  “The Collected Writings”,  Helena Blavatsky, TPH, Índia, volume III, pp. 55-61 e pp. 286-287. E também “The Collected Writings”,  volume IV, pp. 439-443,  entre outros textos.    

[9] “Dreams From My Father”,  Barack Obama, Three Rivers Press,  1995 e 2004, New York,  458 pp., ver p. 17.

[10] “Dreams From My Father”,  Barack Obama,  obra citada, ver p. 09.

[11]  “Dreams From My Father”, obra citada, p. 10.

[12] “A Audácia da Esperança”, Barack Obama, Larousse do Brasil, SP, 2007, 400 pp., ver pp. 221, 222. Nesta citação, segui a edição original em língua inglesa nos casos em que a versão brasileira está inexata. Em inglês, ver “The Audacity of Hope”, Three Rivers Press, 376 pp.,  2006, pp. 203-204.  

[13] “A Audácia da Esperança”, obra citada, p. 223. Na edição em inglês, p. 205.

[14] “A Audácia da Esperança”, obra citada, pp. 236-237.

[15] “Remarks by President Obama in Address to the United Nations General Assembly”, Nações Unidas.  Link: http://www.whitehouse.gov/the-press-office/2011/09/21/remarks-president-obama-address-united-nations-general-assembly.


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O artigo acima foi publicado pela primeira vez em novembro de 2008 em www.FilosofiaEsoterica.com  e websites associados, e atualizado em 2011 e 2012. Em novembro de 2012, foi publicada a sua versão em inglês, intitulada “The Theosophy of Barack Obama”.


Para ter acesso a um estudo diário da teosofia original, escreva a lutbr@terra.com.br  e pergunte como é possível acompanhar o trabalho do e-grupo SerAtento.

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Texto originalmente publicado em www.FilosofiaEsoterica.com .
http://www.filosofiaesoterica.com/ler.php?id=628#.UJsCbOToSpU

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